terça-feira, 13 de dezembro de 2016

Vômito



Deixa eu te contar do meu país
Dos caras que botaram pra dirigir esse caminhão
Tem presidente deputado e juiz
Todos mirando num muro grandão

Aí me pediram pra escolher um lado
Esquerda ou direita é a opção
Mas não to interessado no caminho
Foda-se a direção

Se o destino é sempre o mesmo
E regado de corrupção
De que me adianta correr pra rua
Defender a porra de um ladrão?

Não quero saber das tuas crenças
De nada adianta te ver querendo igualdade
Se quando te olho dentro dos olhos
Tão entupidos da mesma maldade

Xinga no face e quer cobrar
Amor e compreensão
Quer que entendam o que você pensa
Sem nem ouvir a outra versão

Diz a culpa é da globo que soube manipular
Essa gente fraca de crença e instrução
E esquece que o trabalhador só consegue se preocupar
Em encher a panela de arroz e feijão  

Todo bandido é um vagabundo
Não merece compaixão
Direitos humanos nesse mundo
É coisa de gente da televisão

Mas se um dia ler um pouco
Descobre que não é bem assim
Que as celas tão superlotadas
De gente que nada fez de ruim

E aí tem as drogas que eu sou contra
Maconha e crack no mesmo nível
Mas quando chega o fim de semana
Sem a minha cerveja eu não vivo

Adolescente rico e branco
Fumando um no quintal
Do pai que matou o traficante
Que vende pro filho do policial

Esses cara tudo tem nome
Na lista da Odebrecht tem até apelido
Mas o problema do país era a Dilma
O resto a gente finge que não tem perigo

A verdade é que o país não é do povo
É um discurso repetido pra tentar esconder
O medo de passar por tudo de novo
O medo de não saber o que fazer

Quem manda é o dinheiro
Não é político nem população
E enquanto ce caça o deputado
Ele já comprou a votação

Queria pouco, quase nada
Só um pouco de entendimento
Que cada um cuidasse da sua vida
E parasse com esse tormento

Queria militar sim
Mas não por partido ou por espaço na lei
Queria mudar um sistema
Bem maior e mais forte do que um dia eu serei.




E ah só pra lembrar
Brasil de hoje não tem herói
Não na camara e nem na vara
Vamo parar de endeusar o Moro
Que de lavado só tem a cara

sábado, 16 de julho de 2016

Das dez às onze

Um mar de pessoas em direção ao mar
As crianças gritando mas sem festejar
O dia de alegria de repente decidiu acabar
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10:15
  Andava por aquela rua carregando meu casaco na mão. Sabia que o clima na França era mais frio do que estava acostumado, mas tinha esquecido das pessoas que na rua aquele dia faziam um trabalho muito mais eficiente do que os aquecedores dos bares onde visitei.
  O som que se ouvia era de conversas gritadas, de uma música bem alta em um francês inteligível (e francamente pra mim qualquer francês era inteligível) mas aproveitava mexendo os ombros timidamente, fingindo qualquer costume, enquanto tentava atravessar a multidão.
  Muitas crianças de mãos dadas com seus pais, boca suja de algodão doce e aquele sorriso inocente exclusivo das crianças que diz “esse é o melhor dia da minha vida” mesmo nas tardes mais nubladas.

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10:19
  Não muito longe, há duas quadras dali, ele olhava pro seu chaveiro. Ou era para os dedos que insistiam em tremer? Ou será que o chaveiro e o dedo eram apenas um ponto fixo pra descansar os olhos já que a mente experimentava fatiga de tanto exercício?
  Tinha que dar certo, mesmo se desse errado.
  Está longe de mim tentar descobrir o que o motivara a estar em sua casa naquela noite, talvez uma falta de vontade de se integrar com os outros, talvez algum trauma de multidões tenha ativado dentro de si a vontade de sair de casa naquele estado.
  Ele estava nervoso, mas decidido. Uma voz parecia lhe dizer volta pra cama, mesmo depois de tantos planos, mesmo que ele não tivesse vontade de levantar no outro dia. Mas ele cometeu um engano que na verdade é mais comum do que imaginamos: confundiu prudência com nervosismo e decidiu seguir em frente. Sentado no banco do motorista, não olhou mais para trás.
Se desse certo, se desse errado, não daria mais para se apegar aos pensamentos do que fica pra trás.

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10:25
  O primeiro grito chegou nos meus ouvidos como um eco distante, me lembrou as vezes quando estamos escutando música em um lugar barulhento e não conseguimos decifrar exatamente se o som estranho que aparece vem da música ou das pessoas do nosso lado.
  Já no segundo grito, que demorou menos que o tempo de olhar pra trás, todos os meus pelos arrepiaram, as pernas pareceram me enganar e eu tinha a sensação que o que estava por vir mudaria a minha vida.
  Que sensação idiota essa, tenho que confessar. A minha vida pouco importou comparado com o que aconteceu depois.
  De longe se via um caminhão branco, rápido demais para não saber que a rua estava fechada e entupida de gente festejando.
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10:32
PFFFF PFFF PFFFFF
Ele passou pela primeira aglomeração
Lembrou vagamente de um jogo de boliche
Mas a adrenalina não deixava os pensamentos terem forma
PFFFF PFFFF
Agora é tarde pra parar
PFFFF PFFFF PFFF
Ele não quer parar. E num mundo de obrigações e expectativas, um mundo de desilusão e falta de compaixão, o querer é mais que suficiente pra te fazer errar. Pela primeira vez o controle era dele e ele apertava o botão que quisesse.
Apertou, o acelerador.
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10:35
  No tempo que ele chegava perto da segunda multidão (a mais volumosa e a que eu tinha tentado me infiltrar no começo da noite) eu já estava em direção a areia. Pensava que o quer que estivesse tentando nos matar, não me pegaria se eu estivesse dentro d’água. No entanto tive tempo de marcar na minha memória cenas que eu poderia dizer serem de filme de terror, mas os filmes de terror não conseguem captar o silencio do pânico.
  Digo silencio não porque todos estavam quietos, aliás escutavam-se mais alto ainda os gritos, crianças e adultos, alguns sendo atingidos e descartados pelo chão formando uma trilha de sangue e partes de corpo, uma trilha de memórias desperdiçadas e sapatos rasgados, uma trilha de vida que não mais é viva.
  Mas existe um silencio no meio do pânico, um silencio sutil e quase imperceptível se você não estiver prestando bastante atenção. É o silencio que grita uma indignação e todos parecem sentir ao mesmo tempo, uma incredulidade com o que seus olhos veem. É a certeza de que não há limites para um homem atormentado ou a dúvida do que será da sua vida agora que presenciou o inimaginável.                                  
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10:57

  Já de volta a rua, agora aglomerada de policiais, vi o que me lembrou das fotos de guerra que estampavam as páginas dos meus livros de história. Aparentemente tinha acontecido uma troca de tiros com a policia, e o motorista do caminhão estava morto, junto com incontáveis corpos espalhados pela rua. Todos choravam, alguns pelos olhos, outros pela boca. E quanto mais eu escutava os gritos de turistas perdidos, o choro de mães desoladas, o desespero de filhos abandonados, mais eu desejava estar bem longe dali.
  Fui andando, a procura de alguém que de alguma forma eu pudesse ajudar, e no caminho escutei uma francesa que vivia em Nice, falando com uma voz quase de professora um inglês arrastado que dizia: “O medo que ele tentou colocar na vida dos que passavam aqui hoje não pode ser maior que a vontade de se unir de um povo traumatizado. Enquanto o mal trabalha solitário, a nossa força aparece quando estamos juntos. Não tenho raiva, porque foi ela que motivou ele a sair de casa hoje. Não tenho medo, porque medo nos impede de compreender e não há reação eficaz sem compreensão.” Eu escutava isso com uma mistura de admiração e julgamento quando um senhor gritando disse que precisava de alguém pra ajudar a carregar o soro de uma vitima que estava sendo socorrida e transferida pra ambulância. 
  Minhas pernas não só voltaram com força total, elas pareceram correr sozinhas até o soro que atravessou a minha mão ao tentar alcança-lo. Tentei mais uma vez. Nada. Olhei pro senhor que continuava gritando. Falei com ele. Não me escutava. O toquei mas ele não me sentia. Agora no meu quarto finalmente percebo que não há como ajudar apenas por querer, não se pode sentir aquilo que não acreditou e nem julgar uma vida que não viveu. O pensamento te leva até a fronteira entre o querer e fazer, meu desejo é apenas atravessar.

(Sobre Nice, 2016)

terça-feira, 1 de dezembro de 2015

Get me drunk 
Cause sober i am no fun
Ive spent so much time recoverying from the past
You aint got a shot at making this thing last

My walls are built just like my bones
You cant break them, you cant touch
Cause its so under my skin
All we have left to do is sin

So get me drunk
And make me hungry for someone
Make me crave your body and soul
And Ill show you where i can make you go

To a place where we will be free
No troubles or people buzzing us in
The whole floor will be our own
And if they bitch we’ll send them home

And as the night is fading away
As the sun is coming to stay
Ill get my things and set you free

Cause nobody here`s hurting like me

terça-feira, 13 de janeiro de 2015

Mistura

Tenho para mim, que no fim, juntar os cacos pode ferir os dedos
E que os erros desaparecem como acordar de um pesadelo
Restando apenas memórias bonitas, como teu cheiro no travesseiro

Tenho pra mim, que quando a pena vale
Quando passa a pena
Junto com toda a dor comum do desapego
O que sobram são os sorrisos de uns dias quentes
E dos frios, uns abraços de morcego

E essas memórias que restaram entram num baú com vida própria
Que as vezes te confunde, mas as vezes te conforta
Porque te lembra histórias de personagens inventados
Te lembra que o que você viveu teve algum significado
E que esse baú junta tudo o que já existe do seu legado

Tenho pra mim, que enfim, não é preciso se torturar
Que respirar fundo é a mais tranquila forma de chorar
E que não demora muito pra sentir esse mundo girar


Tenho pra mim que chega a hora em que olhar pra dentro é mais bonito que olhar pra trás.

Gasolina

Não me peça pra ficar
Pois a dor de (te ver) partir
Que tanto já me fez chorar
Vai servir de gasolina
Alimentando esse desejo de mudar

Por favor fale baixo
Faça silencio
As tuas palavras me confundem
Tuas promessas me desarmam
E as mentiras

Essas aparecem como nuvens
De longe tão macias
De perto fantasias, irreais
Mostrando o que restou de um dia a dia


Que não mais quero correr atrás.